No dia 1º de julho de 2016 eu tive um surto psicótico que categorizei como o surto número 1. O considero assim, pois foi o primeiro onde eu tive comportamento real de suicídio. Além de estar totalmente fora de mim, cometi automutilações graves e cheguei ao delírio descontrolado de querer tirar minha própria vida. Foi graças a ele que de alguma forma a minha mente doente e ferida atingiu o externo, porque eu teria que esconder todas as marcas e hematomas que eu tinha provocado pelo corpo e no rosto. Graças a ele não tinha mais como eu esconder que, contrariando as minhas palavras, eu não estou bem.
Eu já estava medicada com antidepressivo e ansiolítico. E já tinha até diminuído a dosagem, mas eu me mudei, comecei um emprego novo e por motivos de logísticas e agendas eu parei de ver minha terapeuta tinha mais de um mês. Eu fiz terapia com ela por 12 anos e sou muito grata por toda ajuda que ela me deu, mas além do desencontro de horários, eu já estava sentindo que ela não me tirava mais da zona de conforto. Aliás, as coisas já estavam distorcidas por eu pensar na terapia com um carinho materno, quase como um colo. E terapia ou análise é pra doer, pra tirar pus, secreção, pústulas da mente. E tudo isso dói só de tocar, quanto mais futucar.
Encontrei a minha psiquiatra na mesma semana e alguns diagnósticos foram feitos. Eu saí do “sofro de depressão, ansiedade e síndrome do pânico” e entrei na zona dos transtornos: Transtorno Depressivo Maior, Transtorno de Ansiedade Social, Transtorno Obsessivo Compulsivo, Transtorno Alimentar e Agorafobia. Ela aumentou a dose do antidepressivo para a máxima, aumentou dosagem e posologia do ansiolítico e me receitou, pela primeira vez, o assustador antipsicótico. Ela me explicou que o antipsicótico me ajudaria com essa questão da automutilação e estabilizaria os meus humores, pois eu estava oscilando de deprimida mórbida à ansiedade paranóica em piscadas de olho.
Saí abalada do consultório e senti como ter recebido uma condenação. Passei na farmácia e comprei logo todos os medicamentos. De noite, chorei copiosamente quando tomei o primeiro comprido do novo remédio. Chorei de medo. Medo de não melhorar com ele, medo de melhorar com ele, medo de ter que aumentar a dosagem, medo de ter muitos efeitos colaterais, medo de acreditar que eu deixaria de ser eu mesma. Medo.
Poucos dias depois eu comecei a análise com uma nova pessoa. Escolhi um psicanalista, homem e mais velho. Já na primeira sessão percebi que tinha acertado na escolha de tratamento. Antes fiz psicoterapia e agora eu estou em análise. Saí da sessão com dois hadoukens na cara e já tonta de informações e sentimentos.
Demorei alguns dias para me adaptar ao antipsicótico, pois me deu um sono avassalador, mas assim que meu metabolismo se acostumou e eu fiquei novamente disposta, eu comecei a viver sensações e sentimentos que achei ter perdido. Minha criatividade voltou, comecei a me sentir mais articulada, a explorar meu vocabulário em português e em outros idiomas como nunca antes explorado, retomei meu ritmo desenfreado e delicioso de leitura, foco e atenção voltaram a ficar afiados e entre outras coisas.
Não estou falando isso pra falar que a solução está num comprimido, porque não está. Ouso dizer que devo grande parte da minha lucidez à análise, onde venho expondo e abrindo cada vez mais os meus traumas, as minhas feridas e meus medos. Porém foi quando percebi que, de alguma forma que não sei explicar, agora estou no tratamento correto, foi quando decidi sair do armário.
Decidi fazer um post no Facebook para a minha lista de amigos, parentes e colegas de trabalho onde eu expliquei que vinha mentindo para quase todos eles, porque eu dizia que está tudo bem quando nada está bem pra mim. Falei dos meus diagnósticos, dos meus tratamentos e deixei claro que não me importo nem um pouco se quiserem me tachar de louca, pois eu já aceitei que meu pior inimigo sou eu mesma e estive, e as vezes ainda me deparo, à beira de perder essa guerra, por isso pouco me importa mais se eu for colocada de louca ou algum outro adjetivo pejorativo.
Finalmente aceitei e comecei a encarar a minha condição: estou doente. E por estar assim tenho minhas limitações e minhas dificuldades. Aceitar meus diagnósticos também orientou a mim e as pessoas que estão fazendo parte desse processo do que está acontecendo e a melhor maneira de agir e me tratar. Muitas pessoas me falaram que não preciso de rótulos, mas na verdade eles vieram para me libertar.
Quando decidi falar percebi que não só tenho muitas pessoas à minha volta dispostas a ouvir para me ajudar, mas muitas pessoas dispostas a compartilhar experiências para me ajudar. Senti como esta empatia, essa partilha de machucados, ajuda pra quem fala e pra quem escuta. Por isso estou aqui digitando esse monte de palavras que vomito pelos dedos, porque elas precisam sair e acredito que pode acolher os outros.
E assim, desculpe pelos transtornos. Estou realmente trabalhando para melhor me atender. Desejo a todos uma boa leitura.
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