Estou em Copenhagen há 1 ano e meio e ainda não escrevi uma linha sobre a experiência de morar fora ou como foi a mudança. Eu tenho pensado nesse texto por todo esse tempo e tenho trilhões de rascunhos. E hoje no banho cheguei à conclusão que classifico a imigração como um trauma, quer a pessoa queira ou não. Mesmo que a mudança pra outro lugar seja sem perrengues ou doenças mentais, a imigração causa um trauma, sim, porque você se vê sozinho e perdido no mundo diversas vezes. Até mesmo aquelas pessoas mais duras na queda, assim como quando você é criança e está descobrindo as coisas e se machuca.
O que significa que a adaptação pra mim foi o caos. E, sinceramente, muitas vezes continua sendo. Eu ainda não falo dinamarquês, mas pretendo aprender(mesmo sendo horroroso e difícil). E principalmente por causa dessa barreira idiomática me sinto estrangeira o tempo todo nas ruas. Uma hora acostuma essa sensação, mas tem momentos que isso te vem como uma onda gigante e só dá vontade de voltar pra casa(onde é casa?) com o rabo entre as pernas.
Cheguei aqui em pleno inverno e recém informada do meu diagnóstico. Surtei inúmeras vezes sozinha ou com meu marido em casa. Minha psiquiatra brasileira pecou em só contar o diagnóstico às vésperas da minha mudança. Aprendi sobre o que é ser bipolar sozinha e somatizei tudo, virei uma doença ambulante. No início entrei numa fase depressiva grave. Mudança, inverno, falta de rotina e bebidas me levaram a esse quadro. E quando entrei no sistema de saúde e consegui um psiquiatra ele mudou meus medicamentos totalmente.
Meu médico não teve medo de me fazer de rato de laboratório. Tentei 4 tipos de reguladores de humor até ele me dar o Lítio. Tive todo tipo de efeito colateral possível nessas trocas de medicação. Foram meses até acertar. Hoje tomo 5 medicamentos psiquiátricos regulares e tenho um SOS. É claro, também faço psicanálise semanalmente.
Nesse meio tempo eu estudei minha doença e vivi os seus sintomas. Paranoias, psicoses, alucinações, dissociações. Se tivessem me contado antes que essas coisas que sinto, que vejo, que faço ou até mesmo que deixo de fazer é por causa do meu transtorno, a minha infância e adolescência teriam sido, acho, que mais leves. Todo mundo sofre pra conhecer pessoas novas, pra se adaptar em lugares novos, mas eu carrego esse estigma, porque muitas vezes meu cérebro me causa peças e posso ter comportamentos atípicos.
Ter um transtorno de humor é extremamente angustiante e solitário. Tem momentos que estou transbordando e preciso me controlar pra não afogar as pessoas à minha volta. Por isso é tão solitário. Adoraria escrever um texto sobre os benefícios de se ter bipolaridade, mas na real, não tem. Essa doença é como uma criança pequena que você tem que ficar tomando conta o tempo todo, tem que ser prioridade de tratamento na sua vida, porque do contrário pode dar merda.
Eu demorei, mas agora entendi que meus planos de vida foram todos modificados, porque todas as vezes que eu estou estável e quero dar um passo um pouco maior, o transtorno dá as caras. Ou vem a mania, ou vem a depressão.
Nesse 1 ano e meio, além de morar fora do Brasil, eu não só conheci um país novo, mas eu conheci a mim mesma verdadeiramente.
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